Necrológio dos Padres e Irmãos da Ordem de São Basílio Magno

Província de São José no Brasil

Pe. Antônio Martinhuk, OSBM

André, seu nome de batismo, nasceu nos arredores de Ternópolis – Ucrânia em 30 de outubro de 1863. Ingressou na Ordem de São Basílio um ano após a reforma da mesma – 21 de julho de 1883. Emitiu os votos perpétuos em 5 de outubro de 1888. Em 1890, na cidade de Krestênópilh – Chervonohrad foi o responsável pelo Apostolado da Oração. Ele foi o segundo missionário no Brasil junto com o Ir. Sofron Horoschuk – sobre sua jornada pelo oceano irmão Sofron descreve muito bem. Suas memórias possuem muitas coisas interessantes que vale a pena mencionar. Partiram em direção a Hamburg – porto alemão, ali encontraram-se com o mais tarde metropolita André Sheptytsky que no momento era o superior do mosteiro de Lviv. Ir. Sofron apresenta uma bela descrição sobre esse encontro com o grande membro da Ordem Basiliana. Aqui está: “Este navio tinha por nome AMAZONAS, depois de inspecioná-lo, voltamos para cidade onde jantamos juntos. Depois entramos em uma pequena canoa que nos levou até o navio, onde às 4h teríamos que partir. Chegando à cabine começamos arrumar nossas coisas, rezamos juntos o terço e assim nos despedimos de nosso padre superior, é um momento de grande dor na alma.  Tudo ficou triste para nós, despedir-se do Pe. André, da Europa, e estar em um navio para uma viagem tão longa e incerta. Deixando a cabine o Pe. Superior me perguntou se tinha pego consigo fumo, pois no navio seria difícil ou impossível de encontrar. Disse que esqueci completamente. Embora para não fumantes pareça um absurdo, mas para mim foi algo muito importante. Não fumar durante um mês, mas aconteceu, o que fazer? A culpa foi minha por não lembrar, terei que fazer essa penitência. Sair para a cidade já era tarde, passado das 22 horas. Ficamos ainda tempo com o Pe. Martinhuk até se escutar a última batida do remo que levava nosso padre superior e, com grande tristeza retornamos à cabine para passar a primeira noite na água. Rezamos e fomos dormir. Eu não consegui dormir por muito tempo. Tristes rumores se moveram em minha memória. Perto das onze e meia alguém bate à porta de nossa cabine. Apertei o botão da lâmpada e disse: “Pois não”. E quem eu vejo? Pe. Sheptytsky! Me assustei. Pe. Martinhuk também. “O que houve?” – perguntamos imediatamente. Calmamente e sorrindo ele responde: “Nada, trouxe fumo para você irmão, encontrei um bar aberto ainda na cidade e comprei”. Perdi meus sentidos por um bom tempo. Onde se viu, perder tanto tempo por algo tão fútil. Eu não haveria de morrer se não fumasse. É perigoso andar de barco à noite – “não acontece nada” – diz o superior. “Já tens o fumo, fiquem bem e com saúde, mais uma vez me despeço de vocês, boa viagem”.  Havia lágrimas nos meus olhos, eu não sabia como agradecer. Eu não estava feliz com o fumo nesse momento, não, eu já havia concordado em ficar sem ele, fiquei emocionado com o amor e a doação por parte do superior para com o seu coirmão. Este exemplo de doação para o próximo está profundamente gravado em minha memória”. Atracaram em Lisboa – Portugal, e de lá se mudaram para outro navio chamado “PARANAGUÁ”, navio este que foi até o porto que leva o mesmo nome no Paraná. Não foi preciso mudar novamente no Rio de Janeiro. Viajaram assim por mais 22 dias. Em Paranaguá encontraram um “amigo” que quis ajudá-los, mais era um enganador. Nossos viajantes entregaram esse polonês às autoridades, e sua atividade enganosa terminou. Ir. Sofron descreve a estadia em Paranaguá: “Fomos à igreja católica à tarde, não era muito longe do nosso hotel. Era dia de São João no Brasil. Eram três da tarde quando entramos na casa de Deus para agradecer ao Todo-Poderoso pela boa viagem. Ajoelhei-me diante do altar principal, e o Pe. Martinhuk no banco mesmo. Depois de algum tempo, os brasileiros começavam a chegar na igreja, escuto um rugido e latido de cães na igreja, risadas, olho em redor pensando que talvez os cães tivessem atacado o Pe.  Martinhuk, observo bem e noto dois cachorros comendo em frente a igreja, os brasileiros os chutavam, outros provocavam e riam. Para eles parecia algo comum, para nós era muito estranho. Quanto mais pessoas vinham, parecia ser impossível rezar. Fomos até a sacristia perguntar pelo padre pároco, mas o  encontramos. Pe. Martinhuk se apresentou como sacerdote ucraniano da Ordem de São Basílio Magno, e a mim como irmão professo desta mesma Ordem. O pároco nos cumprimentou de bom grado, imediatamente pediu para participar da procissão que iria percorrer a cidade em homenagem a São João. A procissão foi muito estranha para nós, não havia bandeiras, nem imagens, ninguém cantava ou rezava. Parecia estranho, as pessoas estavam andando como em uma caminhada normal, algumas estavam até usando chapéus”. Depois disso foram até a ferrovia em direção a Curitiba. Permanecendo ali um dia, novamente pegaram trem para Ponta Grossa e dali um tal de Mazur os levou até Prudentópolis. Em Imbituva pela primeira vez se encontraram com o nosso povo. Levantando o toldo da carroça, pela primeira vez o irmão Sofron escuta: “Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo – Слава Ісусу Христу”. Não há como descrever o sentimento de ouvir a própria língua em uma terra tão estranha e distante. Sim, porque a língua nativa é um grande tesouro. A pessoa que cumprimentou o Ir. Sofron não morava em Imbituva, estava trabalhando lá. Aos poucos mais pessoas foram se achegando, logo a sala onde estavam ficou lotada, conversaram até meia noite, e ninguém pensava que os dois estavam exaustos. No outro dia às nove horas da noite o sino da capela de Prudentópolis tocava. Quanta alegria e choro naquele momento. Os colonos já cantaram “muitos anos” e depois dessa saudação “Virgem Mãe Santíssima, rainha dos rutenos”.  No outro dia, que era domingo houve a saudação do pão e sal. Pe. Martinhuk presidiu a Divina Liturgia e fez a pregação. Todo o povo chorou de alegria e saudade de sua terra natal. E assim Pe. Martinhuk inicia sua missão. O sr. Degan assim descreve a pessoa do Pe. Martinhuk: “Era uma pessoa que gostava de brincar, assim outros dizem também. Gostava muito de estar com as pessoas. Quando se encontrava com algum anfitrião por onde passava, ali ficava até altas horas conversando. Pe. Martinhuk defendia a Ucrânia! Andava a pé pelas ruas e pelos povoados. Amava muito o nosso povo e sentia compaixão por eles. Ele costumava dizer: “Gente, deixe-me morrer entre vocês agora”. Chegando da Galícia estava bem de saúde, mas aqui acabou adoecendo. As pessoas choravam e pediam mais padres, pois era terrível morrer sem nenhum conforto dos céus, então o Pe. Martinhuk sempre os confortava dizendo: “Não sofra por não haver sacerdote, bata no peito e grite que você ama a Deus”. As pessoas mais idosas diziam que Pe. Martinhuk pregava missões em todos os lugares, até mesmo nas ruas. E assim também foi na Linha Piquiri em 1899, incentivava o povo a permanecerem firmes em sua fé e no seu rito, como alguns dizem, até suava ao falar sobre isso. Houve uma briga entre as pessoas naquela localidade por causa de um mal entendido sobre o registro da igreja. Alguns foram até contra o nosso missionário e ficaram na estrada para impedir a sua passagem. Algumas dezenas de homens o acompanharam até Prudentópolis”. Pe. Martinhuk teve também uma missão na Linha Nacar (Marcondes). Sr. Vassílio Shulek descreve esse acontecimento: “A missão aconteceu lá onde é a casa do Choma. Todos os dias o padre vinha a pé de Prudentópolis, pois sempre tinha que voltar para atender também lá o nosso piedoso e zeloso povo. Pregava três vezes ao dia, e dava catequese para as crianças.  Em 1901, após a festa da Apresentação do Senhor, teve missões em Eduardo Chaves. Em Barra Grande esteve resfriado até o final das missões, aqui também queriam o atacar e não permitiram sua entrada na capela. Na igreja Nossa Senhora do Patrocínio, em Esperança, abençoou e distribuiu muitos santinhos para as crianças, não foi por acaso que logo elas se aproximaram dele. O primeiro responsável pelo Apostolado da Oração entre os ucranianos no Brasil foi o Pe. Martinhuk. A primeira recepção para o movimento aconteceu nas vésperas da Natividade de Nossa Senhora em Prudentópolis em 1899. O primeiro zelador dos homens foi o Sr. Basílio Woitóvitch, e para as mulheres a Sra. Anna Forkévetch de Rio Preto. Pe. Martinhuk se esforçou também para a construção da igreja de São Basílio em Prudentópolis. Assim dizia o povo: “antes do raiar do sol, ele já estava entre os trabalhadores perto da igreja. Cada semana convidava cada um para fazer a confissão. Quando a igreja estava sendo construída, reunia os jovens e as crianças. A chuva caía e o padre estava lá, puxando terra com o carrinho. Trabalhava todo o dia”. Voltou para a Galícia em 1902, até o fim de sua vida esteve enfermo em Lviv, pouco antes de sua morte o transferiram para o mosteiro e noviciado em Kréxiv, onde no dia 17 de maio de 1917 encerrou sua vida terrena. Os ucranianos no Brasil não podem se esquecer do nosso segundo missionário. Que a lembrança deste sacrifício e amor por sua nação que possuía o Pe. Antônio, incendeia todos os corações para que se unam a Deus, ao seu rito, e todo o povo.

Bujênko, calendário Prácia – 1948.